18/05/2009

A verdade

-A verdade nua e crua, talvez mais crua que nua.
- Verdade?
- É claro que verdade, verdadinha, a cem por cento não é mas…
- Mas o quê? Queres enfiar o barrete a quem? Se não é verdade a cem por cento…
- Hoje em dia, verdades a cem por cento são uma raridade. Espera-se um dia radioso de sol desavergonhado e vai-se ver aparecem nuvens, aguaceiros e um indivíduo constipa-se. Espera-se uma virgem e na melhor das hipóteses aparece com bigode ou com uma pré-rodagem digna de um fórmula um.
- Hoje em dia já nem se espera uma virgem, a não ser que se seja radical muçulmano e se reclame à porta do céu as sete virgens a que se teve direito por ter explodido em sintonia com judeus de preferência norte-americanos. Talvez nem se espere. É mesmo preferível não esperar, não venha aí um Godot de pacotilha que nos faça desesperar.
-Um Godot de pacotilha em formato de verdade, quem diria…
- A paciência de um agrimensor à espera de atendimento no sopé de um monte com castelo em cima, deveras altaneiro, sujeito ao capricho de senhores, isso sim.
- A verdade escondida num envelope de curiosidade.
- O que é afinal a verdade?
- É um estado circunstancial que nos pode levar ao desespero.
-Desvendar a verdade – um toque de magia; uma experiência poderosa que pode desembocar no espanto ou na raiva, na justiça ou na ignomínia, no alívio ou na inquietação.
- A luta, anos a fio, com a ilusão do Pai Natal para acabar de modo inglório na descoberta da fraude. Será isso a verdade a que temos direito?
-Ou enfrentar o nó górdio da dúvida: –Todos os portugueses são mentirosos.
-Na verdade…
- Cada político sabe perfeitamente o que é a verdade, pelo menos a sua verdade, e desloca-se geralmente nesse limbo que calca os dois mundos de modo a não lhe poderem invocar inverdades.
- E a verdade do comerciante…Na idade média escurecia a sua loggia para que o cliente carregasse mais fruta podre, hoje ilumina com neons para que o barulho das luzes disfarce a mercadoria.
-Queres comprar a minha verdade?
- Eu? Gostaria de deixar de ser filósofo mas não sei fazer outra coisa. Não posso comprar a verdade, posso é persegui-la até onde ela resista, como água a fugir entre os dedos de uma mão a fechar-se. Contar o quê?

1 comentário:

Guiomar Fernandes disse...

As verdades a cem por cento são efectivamente uma raridade. Estamos tão embrulhados no invólucro da mentira que, frequentemente, temos dificuldade em distingui-la da verdade.
Saberemos se é verdade o que buscamos?